domingo, 26 de fevereiro de 2012

Será mesmo saudade?

         Certa vez um bom amigo escreveu que a saudade é um sentimento que atinge àqueles que se percebem perdendo pedaços queridos de seu ser; que vêm seus territórios existenciais e afetivos se esboroarem e serem tragados pelo tempo. A estes significados acrescento outros. Saudade, sentimento danado que deixa o coração apertado, angustiado, melancólico pela falta de. Falta de algo, de alguém, de alguma coisa. Mas não de qualquer coisa, de qualquer algo ou de um simples alguém. Mas das coisas que marcam  nosso corpo como cicatrizes, de algo que nos toca a alma e adensa o peito e o espírito, de alguém com quem compartilhamos experiências marcantes, em relação a quem nutrimos os maiores desejos e os melhores sentimentos.
        Saudade, sentimento arretado de quem se quer sempre colado, agarrado no outro. Saudade, sentimento egoísta de quem não quer perder, de quem não quer dividir, compartilhar, de quem quer apenas perto de sí; sentimento de quem não quer se distanciar mesmo sabendo que a perda, o distanciamento, o compartilhamento, a partida, a ida sem volta é para o bem próprio ou do outro. 
        Saudade, sentimento safado de quem quer dizer sempre: não vá, volte, fique aqui, pois não permito sua partida; vontade de dizer não quero mais, acabou a brincadeira. Saudade, sentimento dúbio que expressa um gostar descabido de querer estar perto, sempre perto mesmo quando se está distante. Um gostar que surge pela falta, pela distância, pela relutância em não se perder, brigando, lutando contra a falta e a distância, contra a possibilidade de perda, mesmo quando nada se perde e tudo se ganha. 
      Saudade, sentimento que se sente quando se tem laços de pertencimento, de reconhecimento, de identificação. Saudade de coisas que não voltam mais, de lugares que não são mais os mesmos, de tempos que agora são outros e que o tempo não tráz uma vez mais. Mas, sobretudo, saudade de pessoas. De pessoas marcantes, daquelas com as quais dividimos tanto nossos melhores quanto nossos piores dias e momentos, com as quais compartilhamos nossas melhores experiências, das mais intimas às mais públicas, com as quais experimentamos nossos desejos mais ardentes e reservados. 
         Saudade, sentimento bom, mas que quase ninguém quer sentir. Saudade que sinto sem querer, saudade que aperta o peito e contrai a alma, que angustia por estar longe, por se sentir perdendo ao mesmo tempo em que alegra-nos, por nos fazer humanos, demasiado humanos. Humanos no gostar do outro, no querer o outro como parte de sí. Que se alegra ao tê-lo de volta, ao vê-lo voltar e matar a saudade, para que ela possa reviver na próxima partida.

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