Ao longo dos
últimos anos estamos assistindo dois movimentos contrastantes no futebol
brasileiro. De um lado, a transformação cada vez mais rápida do futebol
brasileiro como um todo - não mais só os seus craques e bons jogadores - em um
grande negócio, que movimenta milhões e milhões de dólares todos os anos. O
faturamento de nossos principais times aumentou exponencialmente ao longo da
última década. Cada vez mais eles têm se tornado marcas extremamente rentáveis,
além de empresas esportivas para as quais o futebol jogado dentro das quatro
linhas tem se tornado muito mais um detalhe do que propriamente o centro de
seus interesses comerciais, por mais que seja o produto a venda. Desta forma o
futebol ganhou uma centralidade da e na mídia, no e do marketing não apenas
como entretenimento ou como símbolo social e paixão de multidões, mas,
sobretudo, como um negócio, uma marca, um estilo de vida vendido sob o signo da
saúde, do sucesso e, sobretudo, da grana, da fama e do glamour. Isto tem feito
com que jogadores como Neymar sejam mais que meros atletas, mas, acima de tudo
estrelas, artistas, garotos propaganda. Seus nomes são uma marca. Como o é R9,
R10 e outros mais. Assim, eles propagandeiam e vendem um estilo de vida, que
tem no futebol a sua ribalta.
Por outro lado,
simultaneamente a este processo, o futebol jogado dentro de campo, no Brasil e
pelos brasileiros, na seleção ou nos clubes que defendem, tem se mostrado cada
dia mais pobre, pífio: de craques, de técnica, de futebol arte, alegre, ousado.
Nosso futebol, assim como nossos jogadores estão cada dia mais burocráticos, mecânicos,
previsíveis, tanto dentro quanto fora de campo. Comportamento padronizado,
midiatizado, glamourizado. E isto se reflete na nossa Seleção nacional, que vem
jogando um dos piores futebóis de todos os tempos. Uma Seleção que não mobiliza
mais 190 milhões de torcedores irmanados na simbologia da pátria de chuteiras.
Quando muito empolga a Globo e seus ventríloquos. Deixamos de ser o país do
futebol, justamente no momento em que este se mercantiliza, se moderniza como
reflexo das transformações sociais, políticas e econômicas que o país vem
passando nos últimos anos. O futebol não é mais a única coisa que nos orgulha e
nos dá alegrias, que nos irmana como brasileiros. Há, hoje, outros motivos para
se comemorar, e o futebol, principalmente o jogado pela nossa Seleção, é cada
vez menos um deles.
Ou seja, o
futebol não é mais a nossa única alegria. Ou a alegria das classes populares. Nos
últimos anos estas descobriram os shoppings
centers, as compras, o consumo, as viagens, o carro novo, as festas de
massa, os shows privados, etc. tudo isto se tornou acessível. O Brasil não é
mais apenas o país do carnaval e do futebol. Apesar das tentativas do maior
conglomerado midiático do país – as Organizações Globo – em continuar buscando
preservar e vender estas imagens, muito mais como forma de perpetuar seus
interesses econômicos e políticos do que propriamente por uma crença nestes símbolos.
Desta forma, nosso
futebol vem se transformando numa grande farsa, numa encenação midiática que
tem posto fim ao seu brilho “natural” de outrora. Craques produzidos pelo
marketing e pela mídia que acreditam na fantasia que nossos comentaristas de
futebol lhes contam e inoculam a cada programa esportivo. Não temos sequer um
grande nome de destaque no futebol mundial, atualmente. O nome que temos é
apenas uma promessa a nível internacional, um segundo “Robinho aspirante a
quase Pelé”, se concretizando apenas como realidade no contexto do pobre –
tecnicamente falando – futebol brasileiro e sul-americano, Neymar. Aquele que a
Globo teima em vender como craque, como signo do futebol arte, ousado, moleque.
Sonho produzido na e pelas mentes fantasiosas da mídia brasileira, um sonho no
qual Neymar embarcou como criança mimada. Neymar é sim símbolo do futebol
brasileiro, mas não deste futebol ao qual tentam associá-lo. Ele é símbolo do
futebol brasileiro de hoje, é sua melhor expressão. Um futebol midiatizado, glamourizado,
envolto e porpurinado pelo brilho do marketing, o que busca lhe conferir certo
ar de modernidade, de inovação. Mas, contudo, cada vez mais mecânico,
previsível, burocrático, padronizado na ginga e no estilo, dentro e fora de
campo.
Este sonho
começou a virar pesadelo quando certo baixinho argentino atravessou o sono em
berço esplendido de nosso futebol, humilhando o Santos, justamente o Santos de
Pelé do novo aspirante a ele, Neymar, na final do mundial de clubes. Uma pulga
a incomodar nosso sono e a turvar nossos sonhos e fantasias de ainda sermos o
melhor futebol do mundo. A nos mostrar como se joga futebol, a nos ensinar o
que é futebol arte, criativo, ousado – matéria em que já demos as melhores
aulas para o mundo. Grande ironia. Tragédia do futebol brasileiro. Admitir que
não jogamos mais o melhor futebol do mundo, admitir que quem o faz,
individualmente, é um argentino, este sim candidato a superar Pelé. Admitir que
não somos mais a pátria de chuteiras, que nossa Seleção não nos irmana mais
justamente quando, depois de anos, vamos sediar uma Copa do Mundo, não somos sequer
um dos quatro maiores favoritos ao título. Tragédia ao quadrado, potencializada
por um sem número de escândalos que envolvem a entidade máxima do futebol brasileiro,
a CBF, e o seu mais longevo presidente, Ricardo Teixeira, recém-saído do cargo.
Futebol cada vez mais submetido aos interesses da Globo e distante dos
interesses daqueles que realmente o fizeram ser o que é: os jogadores, o
torcedor, o povo, o brasileiro comum.
Infelizmente,
estamos longe de uma nova aurora. Mesmo sabendo que o futebol jogado dentro das
quatro linhas é imprevisível, apesar disto o crepúsculo do nosso parece querer
perdurar por mais alguns anos ou ao menos não enxergo um horizonte menos escuro
para o mesmo até a Copa de 2014; pois, infelizmente, nos dias de hoje, o
futebol não se faz mais apenas dentro de campo. Este é apenas a cobertura do
bolo, um detalhe.
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