quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

AS UPPs E A REMOÇÃO BRANCA NAS FAVELAS DO RIO OU A CIDADANIA SOBE O MORRO DE CAVEIRÃO E QUANDO APEIA DÁ DE BICO EM QUEM MAIS ESPERAVA POR ELA: OS POBRES.

          Ao longo dos últimos meses estamos assistindo, alguns embasbacados, aquilo que vem sendo chamado pela grande mídia, em especial pela GLOBO, de processo de pacificação das favelas cariocas. E este processo nas telas da GLOBO é cada dia mais superdimensionado e espetacularizado como verdadeiras façanhas holiodianas - a cunhagem deste termo é minha - que têm levado cidadania, Estado e liberdade para o povo humilde da favela e segurança para a população do Rio. Não devemos negar que em grande medida este processo traz uma série de melhorias para aquelas áreas em um primeiro momento, no entanto, a médio e longo prazo ele parece se mostrar extremamente danoso para a população autóctone. Explico. Esta população antes deste processo vivia em uma situação social em que o Estado não se fazia presente em praticamente nenhum sentido, sem oferecer saúde, educação, segurança, condições de moradia digna etc, mas também pouco ou nada cobrava de impostos ou permitia ou dava condições para que as concessionárias públicas ou privadas cobrassem contas de água, luz, esgoto, telefone, TV a cabo entre outras. As favelas pareciam funcionar sob regras próprias, internas a cada uma e correlatas ao poder e ao sabor dos chefes do tráfico de plantão, que faziam as vezes do Estado, na ausência de sua presença efetiva. 
            Mas, com a chegada do Estado, repentinamente, pressionado pela iminencia da realização da Copa do Mundo e sobretudo das Olimpíadas e a necessidade de construir e mostrar para o mundo a imagem de uma cidade civilizada, pacificada este processo se tornou urgente. E com a urgência com quem ele vem sendo feito, os mais prejudicados parecem ser, como sempre, as pessoas mais humildes, residentes a anos naquelas localidades. Porque o Estado subiu o morro e levou a reboque não só um arremedo se segurança, de educação, de saúde, de condições dignas de moradia, mas também trouxe consigo os impostos, as suas cossecionárias e as privadas para cobrar pela luz, pela água, pelo esgoto, pelo telefone, pela TV a cabo. Trouxe também seus parceiros privados, ligados a especulação imobiliária que, nas favelas do Rio, se aproveitam cada dia mais da imagem criada e vendida para o mundo da favela como cartão postal e ponto turístico para estrangeiro ver. Neste sentido o processo de pacificação se direciona muito mais para este fim, potencializar as favelas como ponto turístico, agora pacificado, civilizado, higienizado e com as belas visões das belezas naturais que lhes são prórprias e que antes eram aproveitadas apenas pelos seus habitantes e o chegados do tráfico. 
             Assim, ao potencializar a favela como ponto turítico, aumenta-se o preço do aluguel, da alimentação, da diversão, da bebida, da vida como um todo. Trouxe também as grandes lojas e redes de supermercados, de farmácia, as boates classe média e uma gama de serviços em geral que terminam por encarecer a vida na favela, fazendo a venda da esquina quebrar, e toda a rede de solidariedade e comércio comunitário que girava no seu entorno, no crédito de boca, no fiado, na venda ao conhecido sem precisar de cartão ou dinheiro, o barzinho "pega bêbado" fechar as portas, o funk no alto do morro deixar de ser para toda a comunidade e passar a ser para quem tem condições de pagar e, também, sem o tráfico para suprir as necessidades básicas da população, em troca de proteção e anuência, quando tudo o mais faltava e falhava.
             Desta forma a vida na favela vem ficando cada vez mais cara, cada dia mais impossível para aqueles. que a construíram e que moram lá a anos, que fizeram daquele espaço sua referência existencial, que subiam o morro anos a fio, mesmo diante da presença do tráfico e de seus soldados, sem serem incomodados, pois todos conhecidos. Pessoas que agora se vêm diante da impossibilidade de continuar morando ali por não terem a condição financeira de arcar com as despesas que o Estado trouxe com sua presença, despesas estas que não faziam parte do orçamento de praticamente nenhuma família e que cairam de paraquedas, subiram o morro de caveirão, de tanque e por lá ficaram. Este encarecimento da vida na favela tem levado a uma migração silenciosa desta população mais humilde para áreas mais afastadas da cidade do Rio, para áreas e bairros cada vez mais distantes. Por ter chegado do dia para a noite, praticamente sem avisar e sem preparar a população para as consequências da sua chegada ou até mesmo possibilitar um hiato para a adaptação da mesma a sua presença, o Estado vem promovendo uma "remoção branca" nas favelas do Rio, remoção esta que atinge principalmente os mais pobres, os mais humildes, realizando, assim, conscientemente ou não, aquilo que as elites cariocas sempre almejaram, higienizar seus arredores do fedor do pobre e de sua estética dita incivilizada.
             A cidadania e a liberdade tão prometida e alardeada pelo Estado e aplaudida e espetacularizada pela mídia subiu o morro de caveirão, mas apeou dele solando e dando de bico naqueles que mais ansiavam e esperavam por elas: os pobres.


          

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